Estava ela sem saber o que fazer. Tinha acabado de voltar de uma viagem ao velho mundo, abismada com a quantidade de velhos que por lá havia encontrado. Não era aquela terra prometida, que enquanto primeiro mundo, apresentava as melhores condições em tudo? Não, em momento algum, do outro lado daquele oceano negro, conseguira soltar um único sorriso verdadeiro, daquele que vem da alma, e a moça tinha riso fácil de costume.
Sobre o vaso sanitário, fumando seu cigarro pré-banho e tentando entender o que havia acontecido a moça olhava seu rosto no espelho. Não chegou a conclusão alguma. Tomou banho. Depois, com menos disposição, como era de se esperar, pois havia enfrentado 27 horas de viagem, comeu um pouco do tão sonhado arroz com feijão e pode cair em sua deliciosa e confortável cama. Dormiu por tantas horas quantas foram necessárias, neste caso, 6. Acordou exausta. Mas com a sensação de não saber onde estava exatamente. Sua adorável mãe apareceu e lhe deu um sorriso que há dias sonhava. Ela estava satisfeita com seu retorno.
Não conseguia falar muito, porque ficou um longo tempo em silencio por não conseguir se comunicar. Tinha descoberto o caminho do inferno, e ele começava no momento em que as incompatibilidade idiomática surge. Não saber se comunicar é a sensação mais desesperadora que existia para ela. Mas como os costumes, ainda que ruins, são facilmente absorvidos pelo ser humano, a menina havia acostumado com o silencio. Quando alguém perguntava algo sobre sua tão sonhada viagem, ela simplesmente respondia: não existe lugar melhor do que sua própria casa. É fundamental ter raiz. Mas é mais fundamental ter galhos que sabem falar com todos os tipos de ventos, um dia você vai precisar.
O telefone toca. As pessoas chegam. Abraços, beijos, falas e mais falas e mais falas. Ela se emociona de ver tanta gente falando ao mesmo tempo e se da conta de que lá, no velho mundo, eles são tão civilizados que cada um espera sua hora para falar, tudo muito parecido com as novelas ruins que passam na tv, e o predomínio insuportável das palavras sil te plâit e merci já não existe mais, é a glória, poder ser menos educada e mais expressiva é condição fundamental para sua felicidade.
Nunca havia sido uma pessoa de classe, mas também nunca havia falhado em sua sensata educação. Não em sã consciência! As vezes de bebedeira deveriam ser desconsideradas, pois quem é que permanece educado após algumas doses de qualquer álcool? Nunca conseguiu ficar bêbada no velho mundo, e olha que bebeu quase todos os dias.
Pensou que não iria voltar, que ia fixar residência naquele reino distante. Sonhava com o amor e até chegou a acreditar que poderia ter uma vida feliz apesar de ter que se casar. Mas como não podia deixar de ser, o mocinho não usava o mesmo tipo chapéu. Ele havia lhe prometido chances e oportunidades. E porque ela o amava acima de todas as outras coisas, ele pensou que poderia fazer com sua vida o que ele quisesse. Só que ele esqueceu que a menina tinha uma personalidade fortíssima, apesar de seu jeitinho delicado e doce.
O mocinho, a principio, o príncipe de seus mais nobres sonhos, não correspondeu as suas expectativas. Era teimoso demais para poder manter sua delicadeza. No seu reino, que era gelado, apresentou-se com um coração frio e distante, que nem embaixo dos cobertores esquentava. Ela sentiu frio. Quis realizar os sonhos há anos sonhados, mas o mocinho nem havia preparado a cama para que eles pudessem se deitar. Ela sentiu frio. Apesar de todo o carinho e amor recebido por parte de todas as outras pessoas daquele reino-iceberg, a menina do chapeau rouge decidiu juntar suas coisas e voltar a sua vila onde o brilho existe do chão ao céu, e com maior força nos olhos dos seus tesouros que havia deixado pra trás. Tinha inúmeros tesouros e sabia disso antes de ir, decidira abandona-los pelo sonho do mais doce amor. Tolice! Mas ela ainda não sabia disso.
Decidida a retornar ao reino-iceberg em busca de seu amor, a mocinha se dedica freneticamente ao aprendizado do idioma que já arranhava um pouco, para poder retomar o sonho antigo, mais apta a sobreviver no inverno da vida. Ela já sabe falar melhor sobre as choses da vie, mas não consegue encher seu coração de alegria ao dizer que vai morar naquele reino encantado. Volta a sua rotina antiga, se apaixona ainda mais pelos seus preciosos tesouros, e o mocinho a quem amava se esforça para recebê-la de volta. Mas seu esforço é pesado, tão pesado que ele fica, aos olhos da menina, ainda mais intransigente. Ela se decepciona mais uma vez, e por não querer se submeter novamente aos caprichos do seu amado, ela o fere de forma ácida e agressiva. Ele sente. Sente tanto que corta os contatos diários.
Ela sofre, mas se sente aliviada. Ele sofre.
Não sabem como se aproximar. De repente um oi surge, seguido de uma fala do tipo: “e aí, o que que a gente faz da vida?” a mocinha fica sem reação. Naquele instante, com aquela pergunta, ela percebe que, apesar do mocinho continuar sendo o seu grande amor, eles não compartilham o mesmo tipo de chapéu, e o que é pior, não olham para a mesma direção. Ela entende que por mais que seu maior sentimento seja por aquele ser, que já não é mais tão maravilhoso assim, mas é o ser que ela ama, ainda, ela não pode deixar de lado tudo o que carrega dentro de seu chapeau rouge e do seu coração selvagem.
Chegam juntos a um consenso: c’est fini! Pour toujours? Quem sabe? Já fizeram isso tantas vezes...
Agora a menina do chapeau rouge assume sua vida, sozinha, sentada, na beirinha do nada, olhando o céu... Pode cair, a qualquer momento, mas prefere observar o infinito! O abismo é pequeno demais para comportar seus anseios. Ao olhar as estrelas, sente saudades, mas opta por contemplar, a distância, aquele lindo sonho que ficou pra trás. Não deixa de querer por perto seu amor, ainda que teimoso e frio, mas não sente a menor disposição para deixar de lado seus bens mais preciosos, que tem nos olhares, os brilhos de todas as estrelas do universo.
terça-feira, 2 de março de 2010
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